Bioacumulação e Biomagnificação: o descarte de medicamentos na cadeia alimentar
A atenção para questões associadas à preservação do meio ambiente é algo recente. Somente na década de 1970, os debates em escala global a respeito dos cuidados com a natureza e a preservação dos recursos naturais foram iniciados. Felizmente, com a realização de outras conferências, somadas à aprovação de novas legislações e à conscientização da população, pautas mais específicas – por exemplo, a atenção à gestão e descarte de medicamentos – têm se tornado mais relevantes. A grande questão é que, conforme as pesquisas nesse campo avançam, surgem novas preocupações.
Hoje, sabemos que o descarte incorreto de medicamentos gera consequências graves, principalmente relacionadas ao solo e à água. O problema é que essas substâncias voltam a entrar em contato com as pessoas e, como geralmente retornam em pequenas concentrações, os efeitos nem sempre são imediatos.
Mas como essas substâncias voltam a entrar em contato com as pessoas? Parte da resposta é encontrada em dois fenômenos que ocorrem na natureza:
Bioacumulação é o processo pelo qual substâncias são absorvidas pelos organismos. Ocorre que algumas substâncias despejadas no ambiente demoram longos períodos para serem completamente decompostas, contaminado a água e a matéria orgânica presente no solo, rios e mares. Esses resíduos de remédios são então absorvidos pelos pequenos animais que habitam esses ambientes, e ficam acumulados nos seus tecidos. Sendo assim, conforme aumenta o tempo que os animais são expostos aos resíduos, essas concentrações em seus tecidos tendem a aumentar.
Biomagnificação é o acúmulo progressivo dessas substâncias ao longo da teia alimentar. Os resíduos depositados nos tecidos dos animais pequenos são então ingeridos pelos animais maiores, e o ciclo pode se repetir várias vezes. Dessa forma, e após se alimentarem de diversos animais pequenos, os consumidores do topo da cadeia acabam retendo uma grande quantidade desses poluentes.
Graças aos fenômenos citados acima, os medicamentos despejados sem tratamento nos corpos d’água conseguem retornar para as pessoas, e como esse envenenamento ocorre de forma muito lenta, é difícil prever quais são as consequências a longo prazo. Algumas pesquisas já começaram a demonstrar os prováveis danos à saúde.
Estudos indicam que a ingestão de água ou alimentos contaminados por fármacos pode acarretar problemas como disfunções no sistema endócrino e reprodutivo e distúrbios metabólicos. Diversos compostos químicos são capazes de interferir no metabolismo. Entre eles, destacam-se os que estão presentes em hormônios, anti-inflamatórios, antidepressivos, hidrocarbonetos poliaromáticos e pesticidas.
De acordo com Américo et al., (2013) já foram identificadas diversas formas de contaminantes farmacológicos nas mais distintas regiões do mundo – incluindo analgésicos, anti-inflamatórios, antipiréticos, antibióticos, beta bloqueadores e disruptores (ou
desreguladores) endócrinos. O estudo chamou atenção, particularmente, para os disruptores endócrinos encontrados, já que são substâncias causadoras de desregulação hormonal.
O texto “Poluição hormonal: feminização em espécies de vida aquática e anfíbios” publicado no site do descartUFF aborda com detalhes a problemática associada a essas substâncias.
Outros fármacos, também encontrados em recursos hídricos de diferentes países, foram o Ibuprofeno, Paracetamol e o Naproxeno. O primeiro já foi associado a danos celulares e genéticos, além da interferência no sistema imune de animais marinhos, e os três apresentaram efeitos tóxicos descritos na literatura, como alterações genéticas e estresse oxidativo.
Por fim, tendo ciência de que o descuido com a natureza sempre provoca consequências negativas, é urgente que as novas legislações voltadas para a preservação ambiental sejam cumpridas e fiscalizadas. Além disso, a educação e a conscientização são peças fundamentais não só para essa, mas para qualquer transformação profunda na sociedade.
Referências:
Americo et al 2013 – OCORRÊNCIA, DESTINO E POTENCIAIS IMPACTOS DOS FÁRMACOS NO AMBIENTE
Ibuprofeno, Paracetamol e o Naproxeno – DOI: 10.5327/Z2176-947820160050
https://tratamentodeagua.com.br/wp-content/uploads/2021/04/1313-3622-1-PB.pdf
https://jornal.usp.br/ciencias/ciencias-ambientais/dificeis-de-remover-farmacos-cosm eticos-e-outros-compostos-contaminam-recursos-hidricos/
https://www.io.usp.br/index.php/oceanos/textos/antartida/31-portugues/publicacoes/s eries-divulgacao/poluicao/811-bioacumulacao-e-biomagnificacao.html#:~:text=Bioac umula%C3%A7%C3%A3o%20ocorre%20num%20n%C3%ADvel%20tr%C3%B3fico, do%20que%20o%20ambiente%20circundante.
0 comentários